Imagine o seguinte cenário: você chega numa cafeteria, pede seu café e, então, o garçom traz sua bebida acompanhada por uma dose de água com gás. A dúvida é instantânea: por que a água com gás acompanha o café? Devo beber antes ou depois de degustar o meu café? E, principalmente: é mesmo necessária a água com gás?
Para saber mais o PDG Brasil conversou
com os pesquisadores Dr. Dhalton Ito, do Instituto de Desenvolvimento Rural do Paraná, e Dra. Rosires
Deliza, da Embrapa Agroindústria
de Alimentos, que ajudaram a discutir sobre o tema.
Água carbonatada (ou água com gás)
A carbonatação da água é a
saturação do líquido com o CO2 gasoso. Em outras palavras, é um termo
utilizado para descrever a dissolução de CO2 gasoso em água com o emprego
de pressão e temperatura.
O CO2 é um gás não tóxico,
inerte e sem cheiro característico, utilizado na fabricação da água gaseificada
(ou, água com gás), além dos refrigerantes e bebidas gaseificadas em
geral.
A presença de CO2 e água leva
à formação de um ácido fraco, o ácido carbônico (H2CO3), mas que não causa
nenhum efeito negativo significativo.
Mas cerca de 900 ml de CO2 são
liberados em apenas 250 ml de água, portanto a bebida causa uma ligeira
dilatação do estômago, dando a sensação de inchaço e saciedade.
A razão de servir água com gás e café
Ao que parece, servir água com gás
junto com o café tem o objetivo principal de limpar as papilas gustativas e
preparar nosso paladar para o que vem a seguir. Ou após.
Qual tomar primeiro?
Para a maioria dos entusiastas da
combinação café e água com gás. ANTES!
Para o Dr. Ito a “limpeza do
paladar” segue a teoria de remover contaminantes na cavidade bucal que possam
inibir a identificação de atributos, seja a impregnação de sabores de outros
alimentos ou até mesmo os de balas, chicletes e remédios.
“A carbonatação da água causa
estímulos na cavidade oral que levam à alteração na produção de saliva viscosa
em maior quantidade, promovendo tal sensação de limpeza e frescor”,
explica.
O pesquisador complementa que
mesmo assim não acredita que isso seja suficiente para limparmos o paladar, mas
o efeito placebo também deve ser levado em consideração.
Além disso, alguns especialistas
dizem que a quantidade de água oferecida (uma dose pequena – 50 ml) não é
suficiente para atingir o objetivo de limpeza do paladar. Seria necessária uma
garrafa de água para que a limpeza tivesse algum efeito.
Os limpadores do palato
Segundo a Dra. Deliza, os produtos
usados para limpar o palato são comumente empregados em estudos de avaliação
sensorial para limpar a boca antes e entre as amostras e é uma prática comum
num ambiente formal (laboratório) e informal (cafeteria, por exemplo). O
objetivo é minimizar substâncias residuais que podem interferir na avaliação.
A pesquisadora diz que um bom
limpador de palato deve aumentar a discriminação entre os produtos e reduzir os
efeitos de adaptação, isso é, reduzir a sensibilidade aos estímulos, por
exemplo doçura, acidez etc.
Ao provar vários cafés, algumas
pessoas também preferem beber água entre as amostras para facilitar o processo
sensorial de degustação.
Um estudo testou
algumas opções para a limpeza do paladar (bolacha cream cracker, água comum,
água com gás, incluindo não utilizar nada) numa degustação com o objetivo de se
avaliar a capacidade de discriminação das amostras.
Nenhuma das opções de limpeza do
paladar resultou em maior ou menor capacidade em discriminar as amostras. Os
autores foram diretos em afirmar que “essas observações sugerem fortemente que
qualquer eficácia na limpeza do palato é mais provável devido a um ajuste
mental que nos prepara para focar na próxima amostra do que em qualquer limpeza
física”.
Mesmo assim, Dra. Deliza não
desestimula o uso de produtos para limpar o palato e diz que sua utilização é
fundamental e não pode deixar de ser empregado nos estudos sensoriais, tanto
com avaliadores treinados quanto com consumidores.
“É fundamental pela função que têm
de reestabelecer o mesmo ambiente na boca antes de cada avaliação de amostra,
visando minimizar o efeito que os resíduos possam causar e, dessa forma,
influenciar a percepção do produto.”
A sensação de secura na boca
Frequentemente descrita em café, a
adstringência é uma sensação tátil, gerada pela redução da lubrificação na
boca, que resulta numa sensação de secura. É um atributo difícil de avaliar,
devido às características particulares da sensação.
Pode levar mais de 15 segundos
para se desenvolver completamente e permanecer por cerca de 5 minutos no
paladar. Fica cada vez mais difícil limpar a boca em exposições repetidas e
pode levar à fadiga.
Um limpador de palato, como a água
com gás, elimina ou minimiza o “acúmulo da sensação” durante várias degustações
e, assim, aumentaria a discriminação da adstringência entre as amostras. Outra
opção seria aumentar o intervalo de degustação entre amostras, mas ainda assim
não eliminaria a sensação residual.
Pesquisadores avaliaram
a utilização de diversos limpadores para aumentar a sensibilidade à
adstringência. Os resultados mostraram que o uso de água (mineral sem gás) ou
mesmo nada, como limpador de palato, facilitará a detecção de diferenças
sensoriais de adstringência.
Mas tem que ser água com gás?
Para muitas pessoas do público
geral mesmo ou especialistas não é necessário acompanhamento. Para outros,
beber água comum gelada tem um impacto superior do que água com gás antes ou
depois do café. Outros ainda recomendam água sem gás à temperatura ambiente.
O importante é a qualidade e o pH
da água, que deve estar entre 5,0 e 6,5. Por isso não se recomenda fazer ou
acompanhar o café com qualquer água, já que dificilmente se terá um controle
efetivo sobre essas variáveis. Por exemplo, a concentração de minerais e de
cloro e o pH da água da torneira impactam diretamente no “gosto da água” e,
portanto, interferem no sabor do café.
A Dra. Deliza explica que o café é
uma bebida ácida, que pode afetar adversamente o estômago e intestino. Por essa
razão, a água com gás alivia a indigestão e a irritação e, ao bebê-la, o
estômago recebe camada de proteção contra a acidez do café. E talvez essa seja
uma razão para as cafeterias oferecerem água com gás.
O refinamento da experiência
Aos poucos, as cafeterias prezam
pelos detalhes que tornam o consumo do café mais refinado.
Dhalton, que também é
sócio-proprietário da cafeteria Aviva Cafés,
diz que vem percebendo que diversas cafeterias servem cafés de baixa qualidade
acompanhados por água gaseificada.
Ele afirma que isso se tornou um
padrão cultural, onde parte dos consumidores associam a qualidade do café
servido no local simplesmente pelo fato de ser acompanhado de água gaseificada,
ou mesmo para o próprio estabelecimento ser melhor conceituado. Em diversas
cafeterias especializadas em cafés de alta qualidade, é servido o café sem ser
acompanhado por água gaseificada, mas sempre está à disposição aos clientes que
solicitarem.
Alguns estudos demonstram que a utilização da água com gás para limpar o paladar durante a degustação de café é algo pouco efetivo sob o ponto de vista da ciência. Em termos de saudabilidade, a água com gás antes do café pode contribuir para amenizar a percepção da acidez do café pelo nosso organismo.
Quando se fala em hospitalidade e
experiência, nota-se que os clientes vêm como positiva a presença do copinho
com água gaseificada com o café, agregando inclusive valor à bebida.
No final, o que vale é a
preferência de cada apreciador, contanto que a água não interfira na
experiência de se tomar uma bela xícara de café.
Fonte Imagem: https://sodacristal.com.br/beber-a-agua-com-gas-antes-ou-depois-do-cafe/
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