segunda-feira, 19 de dezembro de 2022

ESPAÇO PAULA E BEBETO: ÁGUA E CAFÉ (PARTE 2 - FINAL)


Imagine o seguinte cenário: você chega numa cafeteria, pede seu café e, então, o garçom traz sua bebida acompanhada por uma dose de água com gás. A dúvida é instantânea: por que a água com gás acompanha o café? Devo beber antes ou depois de degustar o meu café? E, principalmente: é mesmo necessária a água com gás?

Para saber mais o PDG Brasil conversou com os pesquisadores Dr. Dhalton Ito, do Instituto de Desenvolvimento Rural do Paraná, e Dra. Rosires Deliza, da Embrapa Agroindústria de Alimentos, que ajudaram a discutir sobre o tema.


Água carbonatada (ou água com gás)

A carbonatação da água é a saturação do líquido com o CO2 gasoso. Em outras palavras, é um termo utilizado para descrever a dissolução de CO2 gasoso em água com o emprego de pressão e temperatura. 

O CO2 é um gás não tóxico, inerte e sem cheiro característico, utilizado na fabricação da água gaseificada (ou, água com gás), além dos refrigerantes e bebidas gaseificadas em geral. 

A presença de CO2 e água leva à formação de um ácido fraco, o ácido carbônico (H2CO3), mas que não causa nenhum efeito negativo significativo.

Mas cerca de 900 ml de CO2 são liberados em apenas 250 ml de água, portanto a bebida causa uma ligeira dilatação do estômago, dando a sensação de inchaço e saciedade.


A razão de servir água com gás e café

Ao que parece, servir água com gás junto com o café tem o objetivo principal de limpar as papilas gustativas e preparar nosso paladar para o que vem a seguir. Ou após.

Qual tomar primeiro?

Para a maioria dos entusiastas da combinação café e água com gás. ANTES!

Para o Dr. Ito a “limpeza do paladar” segue a teoria de remover contaminantes na cavidade bucal que possam inibir a identificação de atributos, seja a impregnação de sabores de outros alimentos ou até mesmo os de balas, chicletes e remédios. 

“A carbonatação da água causa estímulos na cavidade oral que levam à alteração na produção de saliva viscosa em maior quantidade, promovendo tal sensação de limpeza e frescor”, explica. 

O pesquisador complementa que mesmo assim não acredita que isso seja suficiente para limparmos o paladar, mas o efeito placebo também deve ser levado em consideração. 

Além disso, alguns especialistas dizem que a quantidade de água oferecida (uma dose pequena – 50 ml) não é suficiente para atingir o objetivo de limpeza do paladar. Seria necessária uma garrafa de água para que a limpeza tivesse algum efeito. 


Os limpadores do palato

Segundo a Dra. Deliza, os produtos usados para limpar o palato são comumente empregados em estudos de avaliação sensorial para limpar a boca antes e entre as amostras e é uma prática comum num ambiente formal (laboratório) e informal (cafeteria, por exemplo). O objetivo é minimizar substâncias residuais que podem interferir na avaliação.

A pesquisadora diz que um bom limpador de palato deve aumentar a discriminação entre os produtos e reduzir os efeitos de adaptação, isso é, reduzir a sensibilidade aos estímulos, por exemplo doçura, acidez etc. 

Ao provar vários cafés, algumas pessoas também preferem beber água entre as amostras para facilitar o processo sensorial de degustação.

Um estudo testou algumas opções para a limpeza do paladar (bolacha cream cracker, água comum, água com gás, incluindo não utilizar nada) numa degustação com o objetivo de se avaliar a capacidade de discriminação das amostras. 

Nenhuma das opções de limpeza do paladar resultou em maior ou menor capacidade em discriminar as amostras. Os autores foram diretos em afirmar que “essas observações sugerem fortemente que qualquer eficácia na limpeza do palato é mais provável devido a um ajuste mental que nos prepara para focar na próxima amostra do que em qualquer limpeza física”.

Mesmo assim, Dra. Deliza não desestimula o uso de produtos para limpar o palato e diz que sua utilização é fundamental e não pode deixar de ser empregado nos estudos sensoriais, tanto com avaliadores treinados quanto com consumidores. 

“É fundamental pela função que têm de reestabelecer o mesmo ambiente na boca antes de cada avaliação de amostra, visando minimizar o efeito que os resíduos possam causar e, dessa forma, influenciar a percepção do produto.”


A sensação de secura na boca

Frequentemente descrita em café, a adstringência é uma sensação tátil, gerada pela redução da lubrificação na boca, que resulta numa sensação de secura. É um atributo difícil de avaliar, devido às características particulares da sensação. 

Pode levar mais de 15 segundos para se desenvolver completamente e permanecer por cerca de 5 minutos no paladar. Fica cada vez mais difícil limpar a boca em exposições repetidas e pode levar à fadiga.

Um limpador de palato, como a água com gás, elimina ou minimiza o “acúmulo da sensação” durante várias degustações e, assim, aumentaria a discriminação da adstringência entre as amostras. Outra opção seria aumentar o intervalo de degustação entre amostras, mas ainda assim não eliminaria a sensação residual.

Pesquisadores avaliaram a utilização de diversos limpadores para aumentar a sensibilidade à adstringência. Os resultados mostraram que o uso de água (mineral sem gás) ou mesmo nada, como limpador de palato, facilitará a detecção de diferenças sensoriais de adstringência.


Mas tem que ser água com gás?

Para muitas pessoas do público geral mesmo ou especialistas não é necessário acompanhamento. Para outros, beber água comum gelada tem um impacto superior do que água com gás antes ou depois do café. Outros ainda recomendam água sem gás à temperatura ambiente.

O importante é a qualidade e o pH da água, que deve estar entre 5,0 e 6,5. Por isso não se recomenda fazer ou acompanhar o café com qualquer água, já que dificilmente se terá um controle efetivo sobre essas variáveis. Por exemplo, a concentração de minerais e de cloro e o pH da água da torneira impactam diretamente no “gosto da água” e, portanto, interferem no sabor do café.

A Dra. Deliza explica que o café é uma bebida ácida, que pode afetar adversamente o estômago e intestino. Por essa razão, a água com gás alivia a indigestão e a irritação e, ao bebê-la, o estômago recebe camada de proteção contra a acidez do café. E talvez essa seja uma razão para as cafeterias oferecerem água com gás. 


O refinamento da experiência

Aos poucos, as cafeterias prezam pelos detalhes que tornam o consumo do café mais refinado. 

Dhalton, que também é sócio-proprietário da cafeteria Aviva Cafés, diz que vem percebendo que diversas cafeterias servem cafés de baixa qualidade acompanhados por água gaseificada. 

Ele afirma que isso se tornou um padrão cultural, onde parte dos consumidores associam  a qualidade do café servido no local simplesmente pelo fato de ser acompanhado de água gaseificada, ou mesmo para o próprio estabelecimento ser melhor conceituado. Em diversas cafeterias especializadas em cafés de alta qualidade, é servido o café sem ser acompanhado por água gaseificada, mas sempre está à disposição aos clientes que solicitarem.

Alguns estudos demonstram que a utilização da água com gás para limpar o paladar durante a degustação de café é algo pouco efetivo sob o ponto de vista da ciência. Em termos de saudabilidade, a água com gás antes do café pode contribuir para amenizar a percepção da acidez do café pelo nosso organismo. 

Quando se fala em hospitalidade e experiência, nota-se que os clientes vêm como positiva a presença do copinho com água gaseificada com o café, agregando inclusive valor à bebida. 

No final, o que vale é a preferência de cada apreciador, contanto que a água não interfira na experiência de se tomar uma bela xícara de café. 



Texto extraído de: https://perfectdailygrind.com/pt/2022/07/26/agua-com-gas-antes-do-cafe-por-que/#:~:text=A%20raz%C3%A3o%20de%20servir%20%C3%A1gua,o%20que%20vem%20a%20seguir.
Fonte Imagem: https://sodacristal.com.br/beber-a-agua-com-gas-antes-ou-depois-do-cafe/


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