Mokha, Moka, Mocha, Moca são
termos semelhantes, mas com significados distintos, e muito importantes tanto
para a história do café como para a cultura de consumo e mercado de café
atuais.
Os quatro termos, entretanto, são
intrinsecamente conectados, e se desenvolveram culturalmente por mais de 500
anos. A história de origem da comercialização de café globalmente, no porto de
Al-Mokha, no Iêmen, é o “marco-zero” deste grupo de vocábulos.
MOKHA: porto e a região de origem
Embora hoje associemos a palavra
“mocha” a uma bebida, a palavra em realidade é derivada de um local, a cidade
de al-Mokha ou Mocha, no Iêmen, localizada no Mar Vermelho.
Apesar de a terra de origem do café ser a Etiópia, foi em Al-Mokha que se desenvolveu o primeiro mercado global de exportação de café, o mais importante do segmento dos séculos 15 a 18.
De acordo com a publicação científica de nome “Coffee Trade of the Red Sea in 17th and 18th Century”, de Iftikar a. Khan, quando o Iêmen passou a ser parte do Império Otomano, no século 15, os novos governantes perceberam o potencial econômico dos grãos de café cultivados no país. A localização estratégica de Al-Mokha passou a ser a base de exportações dos grãos iemenitas, que de lá eram transportados por camelos até a cidade de Alexandria, antiga capital do Egito, na costa do Mediterrâneo.
Do Egito, eram direcionados aos portos europeus pela Companhia Holandesa das Índias Orientais, que posicionou a mercadoria na Europa como os grãos de “Café Mocha”.
O “Café Mocha”, no entanto, se referia não só ao local de origem quanto ao porto que os exportava, mas também é o nome da variedade de café arábica cultivada nas regiões montanhosas e de grandes altitudes do Iêmen (propícias para a cultura das árvores de c. arábica).
Nascia aí a associação dos grãos de café com os termos derivados da cidade de Al-Mokha, e também a subsequente confusão quanto ao significado do termo, que perdura até os tempos de hoje.
MOCHA: a variedade de arábica
Segundo o catálogo de variedades
de c. arábica no site da Specialty
Coffee Association, em parceria com o World of Coffee Research,
a variedade Mocha / Mokka é considerada uma mutação do Bourbon, uma subespécie
de Coffea arabica.
A variedade é geneticamente similar ao Bourbon, tem estatura anã e níveis moderados de produtividade, e também gera sementes e cerejas redondas, com notas achocolatadas e vegetais.
Existem dois tipos de
sub-variedades de Mocha (ou Mocha árabe) do Iêmen: Sanani, um grão pequeno com
um grande número de imperfeições, e Matari, que é um grão maior, com menos
imperfeições.
Talvez o gosto e aroma
achocolatado oriundos da variedade Mocha tenham sido os fatores que levaram ao
termo passar a ser usado para designar a bebida derivada da combinação de
chocolate e café, hoje conhecida como ‘Café Mocha’.
MOCA: termo classificador de qualidade
MOCA: termo classificador de qualidade
A designação de grãos de café
‘moca’ tem um sentido diverso dos outros termos, particularmente no Brasil, e se
refere às características específicas quanto à classificação de grãos verdes
designada pelo Ministério de Agricultura do Brasil.
“No Brasil, quando dizemos moca, não nos referimos à variedade Mocha do Iêmen. No meio do trade, esse grão é conhecido pela aparência diversa, por ser um grão pequeno e arredondado”, conta André Peres, trader da ACS Café Comércio Exterior, de Santos, São Paulo.
No exterior, esse tipo de classificação de grão café chama-se ‘peaberry’, e em países latinos, ‘caracolillo’ ou ‘caracol’. Estima-se que cerca de 5–10% de uma colheita de grãos ainda não selecionados contenha ‘mocas’. Tanzânia, Quênia, Peru e Havaí são as origens majoritariamente associadas ao fornecimento de grãos moca.
Os grãos ‘moca’ ou grãos ‘mocados’, (um jargão usado pelo mercado de exportação), ocorrem quando apenas uma das duas sementes germina, devido a mutações ambientais ou genéticas. Essas cerejas produzem apenas uma das duas “metades” dos grãos, ou seja, um grão ‘único’ acaba por preencher o espaço inteiro que seria das duas metades. Os grãos Moca são ovais, pequenos, arredondados e com uma fenda profunda, e requerem um perfil de torra particular, já que são menores do que os demais, e possuem uma quantidade maior de açúcares naturais.
Os grãos moca são selecionados quando secos e através de peneiras com furos de tamanhos específicos. No Brasil, são classificados oficialmente em três dimensões de Peneiras (o sistema usado para classificar dimensões dos grãos): moca graúdo, moca médio e moca miúdo, com peneiras de números 09, 10 e 11).
André, que tem mais de 30 anos de experiência no mercado de café, explica que o fator gerador de grãos moca é comumente associado à genética que atinge determinadas cerejas, mas, na prática, sua experiência de campo lhe mostrou que nem sempre esse é o caso.
Segundo ele, o grão moca surge naturalmente devido às particularidades da anatomia do cafeeiro. O terroir é um ambiente vivo, influenciado por inúmeros fatores, principalmente climáticos. Portanto, diz ele, é natural e esperado que grãos moca apareçam nas colheitas. “A alimentação da árvore vem da raiz, da terra, e quando a seiva sobe e se espalha pela planta, ela chega ‘mais fraca’ no topo, que recebem ‘menos alimento’ da árvore”, ele explica.
Torradores de cafés especiais comercializam o café moca com preços mais altos, por conta de serem raros e requererem mão-de-obra mais laboriosa quanto à seleção, o que equivale a custos mais altos. O perfil de xícara dos cafés moca é considerado superior nesse mercado. Possuem aromas e sabores doces, com notas de chocolate e caramelo (pela concentração maior de açúcares). “Teoricamente ele tem uma bebida mais encorpada e adocicada, mas isso não é regra”, diz André.
MOCHA: chocolate e café
Cerca de três séculos depois de o
Império Otomano transformar a pequena cidade portuária de Al-Mokha no centro do
então maior mercado de exportação de café global, apareceram os primeiros
registros do termo ‘Café Mocha’ associados à bebida que leva café e chocolate.
No século 18, os cafés da Itália passaram a servir bebidas com café que levavam cacau, como o Bicerin. No século seguinte, depois da Segunda Guerra Mundial e com o advento das máquinas de espresso, surgiram bebidas como caffè marocchino e caffè espressino. Ambas contém a mesma combinação de leite, cacau (ou creme de cacau) e café espresso, mas são oriundos de regiões diferentes da Itália, Norte e Sul, especificamente.
Mas foi nos Estados Unidos que se acredita ter surgido o termo Mocha associado ao chocolate, quando a fábrica de alimentos Betty Crocker incluiu o bolo Mocha (que leva glacê de café) em um de seus populares livros de receitas, no mesmo período, na década de 1950.
A receita oficial de Café Mocha, segundo o Instituto Barista, leva 20 ml de calda de chocolate, uma única dose de espresso e leite vaporizado. Na década de 1990, o modelo de cafeterias em cadeia estabelecido pelo Starbucks catalisou a associação do termo Mocha a bebidas cafeinadas entre os consumidores de forma global.
Xaropes e caldas específicos com o sabor ‘Mocha’ começaram a ser produzidos em grande escala pelo Starbucks, e companhias líderes do mercado de xaropes como Monin, Torani e Da Vinci hoje são os líderes de venda do segmento de xaropes para bebidas de café (que têm uma fórmula diversa dos xaropes para drinques alcoólicos e sobremesas, para serem resistentes ao contato com calor).
Subsequentemente esse padrão de bebidas customizadas pelo consumidor, tanto geladas quanto quentes, se espalhou em cadeias internacionais de cafeterias no “modelo Starbucks”.
MOKA: a clássica cafeteira italiana
A cafeteira Moka é um ícone da
cultura do café italiano. Além do design particular, e reconhecível hoje em
todo mundo, a cafeteira Moka é barata e duradoura, além de prática. A Moka foi
patenteada por Alfonso Bialetti em 1933, mas só foi nomeada de Moka uma década
depois, em homenagem à cidade do famoso porto Al-Mokha.
Depois da Segunda Guerra Mundial e da subsequente recuperação econômica mundial, o consumo doméstico de café na Itália dobrou em menos de três décadas. A cafeteira Moka, que é produzida atualmente por inúmeros fabricantes, é o método de preparo caseiro mais difundido no país desde então. Internacionalmente, os números de venda da Moka seguem em expansão, e o equipamento é um dos líderes de mercado do segmento de preparo doméstico de café.
Seja no nome do grão mokinha, seja em um mochaccino, seja na clássica moka onde preparamos café, o porto iemenita Al-Mokha deixa sua marca em toda a cultura do café. Uma cultura marcada por relações, histórias e muito conhecimento.
Texto extraído de: https://perfectdailygrind.com/pt/2022/01/26/sem-confusao-descubra-a-diferenca-e-as-historias-que-conectam-mokha-moka-mocha-moca/
Fonte Imagem: https://perfectdailygrind.com/pt/2022/01/26/sem-confusao-descubra-a-diferenca-e-as-historias-que-conectam-mokha-moka-mocha-moca/
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