Acidez: um dos
atributos mais venerados, mas também os mais contenciosos de uma xícara de café
especial. Amado por consumidores da terceira onda e apreciado por juízes de
competição, também é muitas vezes um motivo de confusão.
Mas afinal, o que é acidez e por que você deveria poder saboreá-lo no café? Ela é boa ou ruim? E como você acentua ou minimiza seu efeito?
O que é acidez?
Picante, azedo, ácido, frutado… são palavras diferentes que foram usadas para descrever a acidez. Mas enquanto temos muitos adjetivos para isso, nenhum deles realmente explica o que ela é. Isto ocorre porque a acidez não é um conceito fácil de se definir, já que toma muitas formas diferentes.
A acidez afeta o sabor e o aroma, assumindo as características de limão, maçãs ou uvas.
Primeiro, é importante distinguir acidez e amargor. As duas são sensações completamente diferentes, mas muito confundidas pelas pessoas. A sensação da acidez é detectável principalmente nas laterais ao final da língua, já o amargor no topo ao final da língua. As vezes só de pensar naquela bala azedinha já sentimos ativar os gânglios abaixo da língua, ligados à sensação da acidez… Portanto, a acidez é rapidamente perceptível ao paladar (aquela “travadinha” que sentimos ao comer uma laranja ou tomar um suco de limão).
Dito como detectar a acidez, passamos à avaliação desta sensação. Pelo protocolo da SCA (Associação de Cafés Especiais), a acidez contribui para a avaliar a vivacidade, doçura e percepção das características frutadas do café. Quando a acidez contribui para o sabor do café, se diz “brilhante”, quando é desfavorável, se diz “avinagrada”. Além da qualidade da acidez, a SCA avalia também a intensidade da acidez, que pode ser alta ou baixa.
Fato é, que a acidez pode complementar ou desequilibrar a harmonia de uma xícara de café. Se a acidez é muito pronunciada, o café se torna “azedo”, e as pessoas normalmente não gostam do sabor. E quanto está sem acidez? Então o café que você irá provar será “sem graça”.
A acidez é um composto químico, e sua presença sempre afetará o sabor do café – para melhor ou para pior. Entender um pouco da química do café pode nos ajudar a obter os melhores sabores possíveis na xícara.
Os ácidos mais comuns encontrados no café podem ser divididos em duas categorias: orgânicos e clorogênicos.
Os clorogênicos são quebrados em ácidos quínico e cafeico. O problema é que os ácidos quínicos não são de gosto agradável; são responsáveis pela amargura, adstringência e acidez da bebida. Já os ácidos orgânicos podem ser cítricos, málicos, acéticos e tartáricos. Estes são os ácidos frutais considerados “bons”, que você deseja saborear na xícara. E todos eles acrescentam suas próprias notas ao café:
Ácido málico - esse ácido é o mesmo encontrado nas maçãs, melancias, caquis… Pode ser encontrado em cafés produzidos em altas altitudes e tem um sabor persistente, limpo, maduro e suave.
Ácido cítrico - como você deve ter imaginado, é a acidez encontrada em frutas cítricas como limão, laranja e abacaxi. É um ácido comum na gastronomia, utilizado para realçar aromas e sabores e preservar a coloração de outros alimentos.
Ácido tartárico - é mais parecido com o que sentimos na uva. É o principal ácido encontrado nos vinhos, já que se desenvolvem a partir do ciclo vegetativo da videira. O ácido tartárico também está presente em sais desenvolvidos a partir da fermentação do vinho.
Ácido acético - é o ácido do vinagre. É considerado um grave defeito na bebida, e se deve a uma fermentação indesejável. Resultado de uma transformação dos açúcares presentes no café, esse ácido provoca queimação no estômago em pessoas mais sensíveis.
Para quem acha que o café, com seu pH 5, é um alimento muito ácido, é legal saber que está bastante próximo ao chá (pH 5,5) e distante de sucos cítricos. Interessante também observar que métodos de extração por pressão como o espresso, tendem a ressaltar a característica de acidez do café, muitas vezes desejadas!
Fatores que influenciam a acidez no café
Sendo a acidez um atributo natural e desejável, é importante entender quais fatores físicos influenciam seu desenvolvimento. Não é surpresa que, como tudo no mundo dos cafés especiais, cada aspecto importa. A seguir, vamos falar um pouco sobre alguns desses aspectos:
Região de cultivo
Que o terroir tem influência direta nas características do café, a gente já sabia. É claro que com a acidez não seria diferente! Os componentes geográficos afetam o metabolismo do cafeeiro, já que estão profundamente ligados à sua fisionomia.
A amplitude térmica ao longo do ano, em especial nas fases críticas de cultivo (Fecundação, passagem de Água para Verde Cana e Amadurecimento), é um dos aspectos mais importantes para o metabolismo do cafeeiro. Se a temperatura, por exemplo, diminui, tudo desacelera na planta; isso permite que a formação do ácido cítrico seja maior.
Um exemplo claro disso são os cafés produzidos em regiões montanhosas, conhecidos por fazer uma bebida mais ácida. Talvez por isso a produção de cafés especiais se concentre acima dos 800m de altitude!
Processos de pós-colheita
Os processos de pós-colheita também tem influência forte sobre os níveis de acidez do café. Os processamentos por via seca (em que os frutos são encaminhados diretamente para a secagem), por exemplo, aumentam naturalmente corpo, doçura e aroma do café, mas mascaram a acidez na bebida. Dessa forma, essa nota é menos tonificada, sutil, indo de moderada a baixa.
O processamento por via úmida, por sua vez, consiste no despolpamento, fermentação e remoção da mucilagem. Somente em seguida os grãos são destinados à secagem, e o resultado é uma bebida de maior acidez e aroma e corpo menos marcantes.
O ponto de torrefação
O ponto de torra é, sem sombra de dúvidas, um ponto importantíssimo na questão da acidez. O café possui cerca de 30 ácidos, alguns deles com propriedades benéficas para a saúde e para a pele (como o ácido clorogênico). Esses ácidos são frágeis, portanto, quanto maior a temperatura da torra, menor a quantidade de ácidos. Ou seja: cafés de torra clara tendem a ser mais ácidas, os de torra média têm níveis de acidez mais equilibrados e os de torra escura, mais encorpados, são menos ácidos.
A moagem
O último aspecto, mas não menos importante, é a moagem. Ela determina o tamanho das partículas de café e, com isso, entra a questão da superfície de contato com a água. Isso por que a água é capaz de extrair as propriedades do café torrado, e os ácidos se mesclam facilmente a ela. Quanto mais grossa a moagem, maior a área de contato com a água, mas boa parte dos demais componentes do café podem ficar retidos dentro dos flocos. Vale a pena considerar os prós e contras e avaliar bem o método de preparo escolhido!
Como controlar a acidez no café?
No momento em que a água entra em contato com o café, os compostos de sabor e aroma começam a se difundir na água – isso é extração. O grau de extração afetará os sabores e aromas da xícara, já que nem todos os compostos são extraídos ao mesmo tempo.
Notas frutadas e ácidas são extraídas primeiro, seguidas de doçura e equilíbrio e, finalmente, amargor.
Isso significa que a sub-extração levará a um sabor adstringente, já que não tem a doçura e o leve toque de amargor necessário para equilibrar a acidez. A extração excessiva, porém, será demasiado amarga, pois a doçura e a acidez serão superadas. Você quer o equilíbrio perfeito.
Então, como você controla a extração?
Fique ligado nas regras de ouro:
Quanto mais fina a moagem, mais devagar a extração acontece. Um tamanho de moagem grossa significa mais acidez; um tamanho fino, mais amargo. Já com a moagem mais fina e um tempo maior de infusão você conseguirá um sabor mais azedo.
Quanto mais quente a água, mais rapidamente ocorrerá a extração. Mas lembre-se: uma temperatura da água muito baixa e os ácidos não serão extraídos. Portanto, procure uma temperatura da água relativamente alta mas um tamanho de moagem mais grosso e um tempo de infusão menor para um copo mais ácido. Ao usar água mais fria, você evitará os ácidos – mas ao fazê-lo não se esqueça de que você precisará aumentar seu tempo de preparação, já que a extração leva mais tempo a temperaturas mais baixas.
E lembre-se que, mais uma vez, é tudo sobre equilíbrio. Se a sua xícara não estiver certa, tente ajustar apenas um desses aspectos para obter a bebida ideal para você. A acidez é um assunto extremamente complexo, com muitos fatores que afetam sua presença ou ausência em uma bebida mas algo maravilhoso sobre o café é que existem tantas notas, sabores e aromas que você sempre encontrará um para seu paladar.
Então, nossa dica é: experimente alguns cafés diferentes. Para ajudá-lo a selecionar, temos nosso indicador de café. Ele lhe indica cafés que são mais próximos ao seu gosto para que você tenha um ponto de partida certeiro em sua caminhada pelo mundo dos cafés especiais.
Texto extraído de: https://blog.ucoffee.com.br/acidez-no-cafe-o-que-e/
Fonte imagem: http://www.thecoffeetraveler.net/new-blog-3/2018/7/30/a-torra-do-caf-e-a-acidez